28.10.09

Neide

O telefone toca. Sorumbático, Dr. Neira olha o número do telefone. Número privado. Muitas coisas incomodam Dr. Neira profundamente, mas apenas duas ele odeia: banana caramelada e número privado.

_ Dr. Neira?

_ Isso.

_ Eu me decidi, vou tomar quimioterapia

_ Neide?

_ Claro, que outro paciente no meu estado você tem?

_ Três, tenho três.

_ Pois então, estou decidida!

_ Neide, nós já conversamos sobre isso, você tem uma tendinite crônica na perna, você não
precisa de quimioterapia.

_ O senhor está errado, eu tenho câncer.

_ Neide, se você já decidiu porque me ligou?

_ Porque o senhor é o responsável pela minha saúde.

_ Responsável pelo que eu receito, certo?

_ Não senhor, eu vou tomar quimioterapia e se alguma coisa me acontecer você é o responsável.

_ Mas Neide, eu sou seu psiquiatra, não posso te receitar sessões de quimioterapia.

_ Pois não vai precisar, eu já arranjei tudo, comprei lá no centro o produto e as seringas.

_ Neide, você está maluca? Isso não é produto que se ache no centro, é remédio controlado.

_ O senhor não tem noção das coisas que podemos achar no centro.

_ Você precisa de acompanhamento médico pra tomar quimioterapia.

_ Por isso liguei pro senhor.

_ Pois esqueça, o máximo que você vai ter é a minha solidariedade à sua família depois do enterro.

_ Credo Dr., o senhor anda tão mórbido.

_ Tem jeito de ser diferente com você Neide?

_ Tem, com carinho e jeito eu costumo ceder.

_ Eu já desisti.
Alguns segundos se passam e Neide abranda a voz.

_ Dr. Neira, o que o senhor acha que eu deveria tomar para curar meu câncer?

_ Posso ser honesto Neide?

_ Pode!

_ Vai tomar no seu cu.
(barulho de telefone desligado)
Trinta segundos se passam com Neide pensativa.

_ É, agora ele apelou mesmo...
Neide tira o telefone da orelha e grita para dentro do quarto:

_ Benhê, pega o telefone do Dr. Claudio!?

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