2.2.07

O Fazedor de Ovo Frito, um conto sobre a simplicidade

Ele era um fazedor de ovos fritos. O legítimo. Desde os quatro anos que sua mãe, irresponsavelmente, deixou-o à beira do fogão a admirar o preparo. A casca sendo quebrada, a clara e a gema caindo, o shhhhh da frigideira, o sal atirado, e o resultado, delicioso. Aos cinco já cozinhava sozinho, aos sete era especialista, aos quinze perfeccionista, aos 17 era o deus do ovo frito.

Ao quebrar a casca, fazia um movimento raro com as mãos, quase imperceptível. Normalmente preferia usar a colher para abrir o ovo, mas poderia fazê-lo em qualquer lugar. A rachadura na fina casca era perfeita, como se tivesse sido feita com régua e lápis. Separava o ovo em duas partes idênticas. Com os dedos do meio cuidava para que nenhum pedacinho sobrasse na frigideira. Deixava dourar o tempo perfeito, salpicava o sal fazendo parecer um golpe de ninjitsu, e ai virava o ovo por sete segundos. Sete segundos e nada mais. E estava pronto. O mais simples, saboroso e perfeito ovo frito.

Desprezava omeletes. Dizia que o queijo prejudicava a cor e o sabor da gema. Devia estar certo.
Decidiu abrir um restaurante aos 24. Aos 27 estava rico, tinha o melhor chef da cidade, o melhor atendimento, os pratos mais sofisticados. Porém, o mais importante da casa, e o mais pedido todas as noites era o ovo frito que preparava.

Foi então que um especialista em gastronomia de uma universidade francesa, que não era Sorbonne, veio ao seu restaurante. Pediu um ovo frito. Comeu e, um mês depois, deu quatro estrelas para aquele restaurante peculiarmente brasileiro.
Foi demais para ele. Largou o restaurante, abandonou sua casa, ignorou deveres e bens e sumiu. Dizem que faz ovos fritos para crianças mutiladas de Serra Leoa, atualmente.

Aquele era um homem de valor. Ele sabia que, por mais pomposo que parecesse o mundo, era na simplicidade que residia o grande sabor da vida. Era no detalhe. E, cá entre nós, a simplicidade é uma virtude que não pode ser medida em estrelas.